O mercado de capitais abraça a multipropriedade

O funding para empreendimentos de multipropriedade já é uma realidade. Já não há mais a desconfiança dos Fundos Imobiliários (FIIs) sobre o segmento. Eles sabem que os altos VGVs (Valor Geral de Vendas) trazem particularidades, conhecem bem os principais riscos e como uma operação deve ser estruturada para trazer retorno aos investidores, tanto que nos últimos meses os fundos alocados em multipropriedades figuram entre os mais rentáveis do país, de acordo com levantamento da CNN Brasil Business.

O estudo e interesse do mercado de capitais já acontecem há alguns anos, desde a explosão da multipropriedade no Brasil, com VGV’s que impressionavam incorporadoras e agentes financeiros e números de empreendimentos aumentando ano após ano. Em 2017, a Caio Calfat Real Estate Consulting divulgou seu primeiro relatório Cenário de Desenvolvimento de Multiprorpiedades no Brasil, indicando 54 empreendimentos e VGV projetado de R$ 11 bilhões. De lá para cá, o mais recente relatório publicado pela consultoria, em 2021, apontou que o segmento já conta com mais de 128 empreendimentos e R$ 28 bi de VGV.

Mas ainda havia muita desconfiança, os FIIs não entendiam bem a multipropriedade (venda de alto impacto, altas taxas de distratos e empreendimentos ainda em construção), além da insegurança jurídica, pois não havia uma lei regulamentando o segmento. Porém, algumas poucas empresas do mercado de capitais apostaram e foram pioneiras em realizar operações de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) para empreendimentos de multipropriedade.

Porém, os movimentos mais importantes para a efetiva entrada de players do mercado de capitais no segmento fracionado foram: a aprovação e sanção presidencial da Lei 13.077, que entrou em vigor em 2019, que regulamentou a multipropriedade e trouxe segurança jurídica; a inauguração de empreendimentos, provando que o negócio era viável e sustentável de fato; e a pandemia, que mostrou que o mercado é forte para resistir a uma crise e entregando resultados para os investidores dos fundings.

A maior parte das operações ainda é através de FIIs de Certificados de Recebíveis Imobiliários, também conhecido como securitização, que são títulos de renda fixa de créditos imobiliários, ou seja, é um financiamento para o mercado imobiliário através da antecipação da carteira de recebíveis. No entanto, outras empresas já começam a realizar outros tipos de operações, como a tokenização, da Toke Invest, e formatar a criação de FIIs específicos para multipropriedade.

O presidente da ADIT Brasil (Associação para Desenvolvimento Turístico e Imobiliário do Brasil), Caio Calfat, ressalta que o mercado de capitais tem uma importância vital para o crescimento do segmento de multipropriedade. “Através das ferramentas de securitização de recebíveis, em que o agente financeiro securitizava os contratos de compra e venda das multipropriedades e adiantava o capital para as operadoras desenvolverem os empreendimentos. Essa operação financeira foi responsável pela quebra de exposição de caixa brutal que o empreendimento de multipropriedade normalmente e tradicionalmente tinha no início do processo”.

“Após 12 a 18 meses de lançado o projeto é necessário ter gerado uma Carteira de Recebíveis suficiente para estruturar uma operação de CRI ou outro modelo de captação, como Private Equaty, que irá garantir na segunda fase do projeto antecipação de recursos para investir na obra e garantir que o empreendimento demonstre ao mercado comprador a sua sustentabilidade”, salienta o diretor de vacation ownership da Bourbon Hotels & Resorts, Luiz Fernando Mathia. “O que também garante que o projeto cumpra todas as obrigações da operação de venda e entrega, gerando internamente e ao mercado credibilidade suficiente para a saúde do fluxo da carteira de recebíveis, reduzindo inadimplência e cancelamentos”.

Regulamentação foi importante para consolidação de fundings na multipropriedade

A Head de Originação de Multipropriedades da Trinus Co., Amanda Moraes, conta que a gestora já vinha observando o crescimento no mercado de multipropriedade, mas a Lei 13.077 formalizou o interesse coletivo tanto de empreendedores quanto de clientes/investidores.

Além da lei, Amanda aponta a evolução do segmento como fundamental para que o FII da Trinus, TGAR11, alocasse recurso na multipropriedade. “O primeiro projeto de multipropriedade que entrou no Fundo de Investimento Imobiliário TG Ativo Real (ticket TGAR11), o principal fundo gerido pela TG Core, investida da Trinus Co, foi o Golden Gramado Laghetto Resort, em 2019”.

A Head de Multipropriedade da Trinus ressalta que o TGAR11 não é um FII exclusivo da mutlipropriedade, mas que a Trinus pretende cada vez mais ter empreendimentos fracionados em seu portfólio. “Faz parte da missão da empresa o interesse em todos os tipos de produtos imobiliários, e queremos ter em nossa carteira os mais diversos tipos de empreendimentos. A Trinus e suas parceiras, que juntas formam a primeira Landtech do país, trabalham para trazer cada vez mais propriedades desse tipo para nossos clientes”.

Para o sócio da Toke Invest e da joint venture Sargas Turismo Compartilhado, Rafael Felcar, a legislação que regulamentou a multiprorpriedade trouxe mais segurança para os investimentos, inclusive com a entrada do modelo de tokenização imobiliária, que a Toke desenvolve.

“A legislação é um fator importante para qualquer tomada de decisão de investimentos, pois é a base da segurança jurídica do empreendimento. Certamente, esta previsibilidade torna o fluxo de caixa futuro mais perene e resiliente, o que atraí capital institucional para o setor”, afirma Rafael Felcar.

Reserva Pirenópolis, empreendimento de multipropriedade da Trinus em Pirenópolis, Goiás

Apetite do mercado financeiro

Para o diretor de vacation ownership da rede Bourbon, o mercado financeiro vem a cada dia abrindo novas oportunidades para o segmento de Multipropriedade. Ele aponta o último ADIT Invest, realizado pela ADIT Brasil, como um termômetro para o apetite do mercado de capitais, já que os participantes falaram muito sobre multipropriedade e novas operações que estão para serem lançadas em breve.

“A pujança deste segmento, de acordo com a pesquisa da Caio Cafalt Consulting, que demonstrou um crescimento de cerca de 17% em plena pandemia, atraiu Fundos de Investimentos Estruturados que estão entendendo mais do negócio e chamou a atenção para formatação de operações de aportes com novos entrantes. Com isto, é possível perceber que recursos para aplicar no início dos projetos estão começando a aparecer, seguindo a modalidade de Privaty Equaty ou estruturações mistas com CRI”, diz Mathia.

O presidente da ADIT Brasil ressalta a solidez dos players da multipropriedade por passarem por crises como um dos fatores pelo apetite do mercado de capitais, contando com mais agentes financeiros no processo de alavancagem financeira. “Como a multipropriedade cresceu de forma consistente, passando por duas crises, outras ferramentas financeiras foram oferecidas para alavancar os projetos. Há a entrada de alguns agentes financeiros mais convencionas e o surgimento de outros agentes oferecendo novas soluções”.

Multipropriedade traz retorno para investidores

Amanda Moraes salienta que já existem fundos alocados em multipropriedades que são bem rentáveis e, muitas vezes, os resultados podem ser melhores que operações de incorporação tradicional ou loteamento. “É importante ser levado em conta que os resultados são de médio ou longo prazo, a não ser que o fundo adquira uma operação já rodando. Na maioria dos casos isso acontece por meio de landbank, o que requer mais tempo, pois os resultados só começam a vir depois da entrega da obra. Por isso nosso fundo faz essa estratégia híbrida, de ter negócios com resultados a curto, médio e longo prazos”.

De acordo com Rafael Felcar, os produtos de investimentos em multipropriedades são eficientes quando bem estruturados e lastreados em empreendimentos que agregam valor para a sociedade em geral. “O investimento institucional demorou para acontecer visto que o profissionalismo ao investir requer um conhecimento mais profundo do racional de fluxos financeiros e comportamento do público-alvo e, com o amadurecimento do setor, cada dia mais os veículos irão alocar em multipropriedades”.

Caio Calfat também enxerga que a rentabilidade de recursos alocados na multipropriedade depende se o projeto tiver um bom estudo de mercado e viabilidade. “São esses trabalhos que chamam a atenção do mercado de capitais. E via de regra, quando o empreendimento é bom, o destino é atraente, o modelo foi bem concebido e desenhado e os valores são razoáveis, se nota uma demanda para o produto e os fundos acabam se interessando”.

Para Mathia, a rentabilidade da multipropriedade atrai mais o mercado de capitais que os VGVs dos projetos. “Mas, principalmente, o lucro líquido operacional que este tipo de projeto oferece”. De acordo com ele, é importante considerar toda a cadeia deste segmento que envolve mais de 12 etapas e variáveis que precisam de um modelo de governança estruturado do planejamento até a operação. “O que irá garantir um círculo virtuoso para que novos empreendimentos possam ser lançados”.

Multipropriedade sem funding

Para Luiz Fernando Mathia, é possível lançar e iniciar a obra do empreendimento sem alavancagem financeira de um agente do mercado de capitais, mas é muito difícil finalizar a construção apenas com a carteira de recebíveis. “Se o empreendedor-investidor tiver capacidade para suportar o fluxo de caixa negativo inicial, comum neste tipo de projeto, até a sua inversão para positivo, pode ser que sim”.

Caio Calfat pondera que mesmo se o empreendedor tiver um caixa substancial para conseguir lançar e finalizar a obra, a busca de um funding irá propiciar ao grupo lançar outros empreendimentos. “A medida que a incorporadora vai buscar mais empreendimentos, e não precisa concentrar em apenas um projeto todo capital ou boa parte, assim a participação do agente financeiro pode viabilizar mais projetos”.

Caio Calfat, Rafael Felcar e Luiz Fernando Mathia.

Novos fundings

Se antes a única forma de captação de recursos pelas incorporadoras de multipropriedade era através de Fundos Imobiliários no modelo de CRI, hoje já há outras maneiras de funding, como a Tokenização, por exemplo.

“Estamos diante de um segmento relativamente novo, com pouco mais de 10 anos em desenvolvimento no Brasil e regulamento com apenas 3 anos. Além dos Fundos Estruturados, Securitizadoras de CRIs, estão surgindo Family Offices e investidores privados interessados em avaliar projetos que são apresentados com variáveis de riscos possíveis de gestão”, afirma Mathia

O presidente da ADIT Brasil ressalta o trabalho que a ADIT Brasil realiza junto aos grandes bancos, para criarem um modelo de financiamento através do crédito imobiliário, que se enquadre no SFI (Sistema Financeiro Imobiliário), o que reduzirá a taxa de juros e aumentará o prazo de pagamento.

“Os grandes bancos podem entrar financiando as incorporadoras, uma vez que uma multipropriedade é um produto residencial como qualquer outro, podendo ser enquadrado dentro da legislação do crédito imobiliário, mas, por enquanto, os grandes bancos precisam entender melhor o negócio”, explica Caio Calfat.

O que é tokenização imobiliária?

A tokenização é uma ferramenta digital para capitalizar um projeto imobiliário, possibilitando dividir um bem, um direito, qualquer ativo em diversos pedaços. “É uma tendência atual em vários segmentos, consistindo em utilizar a tecnologia blockchain para diversos tipos de transações. No caso da Toke, há a permuta do terreno em que será desenvolvida a multipropriedade”, explica Rafael Felcar.
Basicamente, com esta tecnologia, pode-se realizar todos os serviços prestados por instituições financeiras para um título ou cota de um fundo de investimento, com a vantagem do produto financeiro ter menos burocracias e menor custo.

O modelo da Toke Invest consiste na permuta, através da aquisição do terreno em que será construído o empreendimento. Com este formato, soluciona-se um problema de exposição inicial de caixa do projeto, além de que o empreendedor não precisa comprometer a carteira de recebíveis para pagar pelo funding.

“Atualmente trabalhamos com tokenização para trazer liquidez ao setor de multipropriedade através de investimentos terreneiros, os quais permutamos com bons empreendedores. Através de nosso serviço de tokenização as pessoas podem construir um patrimônio imobiliário rentável com menos de R$ 300, o que é disruptivo na sociedade em geral e, com isso, aumenta-se as opções de fundings para empreendedores do setor”, pontua o sócio da Toke Invest.

Atuando com o modelo de tokenização imobiliária para toda a cadeia do mercado imobiliário, seja incorporação ou loteamento, em projetos de multipropriedade a Toke Invest conta com a experiência de parceiros como a TC Brasil, para análise e planejamento de vendas, e da JAM L&T, no segmento de asset manager, através da joint venture Sargas Turismo Compartilhado. “Assim conseguimos colocar de pé veículos de investimentos cada vez mais coerentes para o setor”, afirma Rafael Felcar.

Fonte: Turismo Compartilhado