Valor Econômico | “A multipropriedade é resiliente e tem passado por cima das crises”

Entrevista | Caio Calfat, fundador da Caio Calfat Real Estate Consulting

 

O setor de multipropriedade tem capacidade de se adaptar e expandir pelo país. CAIO CALFAT/DIVULGAÇÃO

 

Após um ano de forte alta, com expansão de oferta na casa dos dois dígitos, o setor de multipropriedade imobiliária inicia 2023 com cautela: a troca de governo e o elevado patamar da taxa de juros causam apreensão, mas não tiram a confiança. O modelo ganhou força no país em meados da década passada, em plena crise hoteleira pós-Copa do Mundo de 2014, e sobreviveu a duas outras turbulências: econômica, com o impeachment de Dilma Rousseff; e sanitária, com a pandemia de Covid-19. A seguir, a entrevista com Caio Calfat, diretor e fundador da consultoria de mercado que leva o seu nome, e presidente da Adit Brasil.

Como avalia a performance desse seu setor em 2022?

Caio Calfat – O setor de multipropriedade é muito resiliente e tem passado por cima das crises, porque tem capacidade de se adaptar e expandir pelo país, confirmando o enorme potencial turístico do Brasil. Entre 2021 e 2022, a oferta de empreendimentos cresceu 21,8% e o total de unidades habitacionais subiu 28,2%. O VGV ficou em R$ 41,1 bilhões.

O que esperar de 2023?

Acredito que a resiliência permanecerá. Os números do ano passado ainda não foram finalizados, mas a percepção é novamente positiva. O VGV potencial deve alcançar R$ 45 bilhões, com mais de 80 cidades atendidas e novos lançamentos.

Qual a maior apreensão do setor para este ano?

A grande preocupação é com a taxa de juros: se continuar nesse patamar, fica difícil para o setor imobiliário “ganhar” do mercado de capitais. Dificilmente o investidor convencional vai mobilizar o dinheiro na aquisição de imóvel. Outra questão é o estoque. Em 2021, estava em 49% – o que é muito alto. No ano passado, 42%. Vamos acompanhar como será neste ano.

Quais regiões têm esse setor mais desenvolvido no Brasil?

A região Sul é a líder. Conforme o estudo “Cenário do desenvolvimento de multipropriedades 2022”, dos 156 empreendimentos nacionais, 45 estão ali – contra 44 no Nordeste; 37 no Sudeste; 24 no Centro Oeste; e 6 no Norte. Co 7,1 mil unidades habitacionais (UHs), tem valor médio da fração avaliada em R$ 99,8 mil.

Mas o Nordeste vem crescendo fortemente e tem um potencial turístico imenso, devendo ultrapassar o Sul nos próximos anos. Em 2022, a oferta na região foi de 6,4 mil unidades, e fração média de R$ 52,6 mil. Já o Sudeste tem o maior número de UHs (7,6 mil) e valor médio de R$ 41,1 mil.

Qual o perfil do comprador?

Pelo relatório, 71,4% têm entre 30 e 49 anos; a grande maioria (43,3%) é casada e tem filhos. E 52,9% ganham entre cinco e 15 salários-mínimos. E 47,6% deles preferem utilizar suas frações em semanas inteiras de uso.

As grandes motivações para a compra são a aspiração social, a racionalização do investimento e a garantia de que a manutenção e a administração do imóvel serão feitas por uma empresa sólida, como uma rede de hotéis. Pode-se até obter renda, ao disponibilizar os dias não usados para um pool de locação. Esse valor geralmente é usado para abater as taxas condominiais.

O público de alta renda tem interesse nesse mercado?

Essa tem sido uma tendência nos últimos dois anos. Ainda que em menor escala, já começam a surgir empreendimentos com essa finalidade, realizados em parceria com grandes bandeiras hoteleiras internacionais – como é o caso do Hard Rock e Kempinski Hotels, que escolheu estrear no Brasil em uma multipropriedade. A Accor também está nesse processo e deve entrar no setor no curto prazo.

Pela nossa consultoria, temos ajudado a planejar empreendimentos em destinos focados nesse público: Trancoso (BA), litoral catarinense, condomínios de alto padrão no interior do estado de São Paulo e dentro de vinícolas.

Fonte: Valor Econômico